Cristina Taquelim

 

Quando o Paulo Monteiro me convidou a escrever sobre as ilustrações do João Vaz de Carvalho, confesso que hesitei. Apesar de acompanhar o que se vai criando ao nível da ilustração, não sou uma especialista na área e escrever sobre a obra sólida do João Vaz de Carvalho, é algo que requer muito saber, mesmo que seja em poucas linhas. Encarei o convite, que desde já agradeço, como um desafio a que tentarei corresponder com honestidade, mas também como uma forma de estender a minha solidariedade à equipa do Festival de Banda Desenhada que com empenho, profissionalismo e paixão, tem feito sempre com tão pouco.

Sobre o João Vaz de Carvalho para além de saber que tinha nascido no Fundão, que levava 25 anos dedicados à pintura e à ilustração e que vencera em 2005 a Bienal Internacional de Ilustração para a Infância, sabia pouco.

Conhecia alguns livros e surpreendi-me com os seu últimos prémios: PrémioVisual em 2008, em Espanha nas categorias Prémio Ilustração e Livro Infantil, com o livro El dia en que lá mamá se puso com cara de tetera, da OQO Editora; Golden Pen of Belgrade Award – na 10ª Bienal Internacional de Ilustração da Sérvia e, já em 2010, menção honrosa no World Press Cartoon, em Sintra.

Faço-me à estrada…escrever sobre o trabalho do João Vaz de Carvalho, obriga-me a regressar às suas ilustrações e a OLHAR.

Livro após livro, site após site, vejo passar à minha frente dezenas de ilustrações, marcadas pelo olhar mudo de espanto das personagens, pelo humor hilariante que logo se contrai, para convidar à construção de novas significações, sem as quais não existe leitura. Em todas elas encontro aquele piscar de lho cúmplice que tanto me encanta no trabalho deste ilustrador.

As figuras, umas vezes surgem suspensas no vazio, convidando o leitor a libertar-se do contexto e abrindo espaço para criação de novas e impossíveis narrativas, outras vezes são colocadas em cenários delimitados pelo contraste da cor que cria ângulos, profundidades e novas perspectivas. Por  vezes a página inquieta-se, enche-se de peripécias, acontecimentos minúsculos, pequenas cenas, que brincam com a atenção do leitor, que lhe falam nas entrelinhas, que ampliam o texto do autor.

É uma ilustração síntese, quase fotográfica a sugerir que usemos os recursos necessários à leitura da banda desenhada, do cartoon, convidando o leitor a preencher os vazios entre as imagens, a interpelar constantemente o objecto.

São ilustrações cheias de movimento, de ruído, que convidam a adivinhar os passos miúdos, a voz seguramente caricatural, as bizarrias dos personagens que sejam humanos ou bichos, partilham os olhos esbugalhados e o espanto por existir.

De onde vêm estes personagens, não sei. Acredito no entanto que no seu trabalho esteja a sua forma de ler o mundo, de fazer a caricatura do mundo, da pequenez dos homens, da ironia da vida que nos faz, por vezes, parecer pequenas marionetas desenhadas pelo João.

 

Cristina Taquelim

Mediadora de Leitura

( Splaft! Caderno da Bedeteca de Beja  Nr. 06, Maio 2010)