António José Teixeira

 

Regalos de espanto

 

É. Digam a toda a gente....o João é um brincalhão. Está na cara. Nas caras. Basta abri os olhos. Ou piscar os olhos. Ás vezes, fechar mesmo os olhos. Tenho quase a certeza que o João pinta de olhos fechados para nos arregalar o espanto.

O João não é deste mundo. É uma espécie de homem invisível que anda por aí a topar-nos, um passo atrás, um à frente...fixa-nos a impotência, o sonho, os coelhos que espreitam da cartola, o vazio, o sono acordado, rendido, os pesadelos, os ponteiros que nos comandam, que nos levam, a lagarta que mina, os escapes, a cabeça pesada, as perplexidades, a fantasia, os fardos, a perdição e a quietude.....Eu sei lá!

O João é um fotógrafo. Apanhou-nos a alma e brinca com ela. Ele é a testemunha dos nossos percursos, ambições, destinos. No jogo da vida vamos desfilando, posando, e ele revelar-nos para nos expor, para nos questionar. Pisca-nos o olho. Percebi agora que o João é mágico do olhó passarinho!

Os quadros do João são de um realismo surpreendente. Despidos de véu e disfarces, depurados, mostram-nos carregados de memórias, quantas vezes vergados às ferramentas da rotina. Flagrantes de ironia ou de sarcasmo, interpelam a nossa correria sonâmbula num Portugal pendurado, destapado.

O João é brincalhão, sonhador, provocador, sabotador, desestabilizador, agitador, poeta, corredor, mágico, ilusionista, contemporâneo de Hieronymus Bosch, coleccionador de ingenuidades, dono de um jardim de humores muito sério.

Há um senão para quem se queira esgueirar dos espelhos lúdicos do João. Lembram-se das Aventuras de João Sem Medo do saudoso José Gomes Ferreira? O João, tentando pelo mistério da floresta, deparou com um muro onde alguém escrevera um aviso: “É proibida a entrada a quem não andar espantado de existir”. Espante-se. Salte.

 

António José Teixeira